Nunca abria a porta do carro, e o principal motivo era justamente por não ter um.
Não dava gorjetas, nem dez por centos.
Não fazia direito, medicina, ou engenharia.
Não ligava pra dia dos namorados, natais, ano novo... E considerava todas essas coisas de uma falsidade e cafonice sem tamanho que, regadas a consumismos exacerbados, não valiam a pouca grana que tinha.
Não paparicava a família dela. Na verdade detestava presentinhos, bajulações, abraços, beijinhos e qualquer coisa que demonstrasse um fingimento latente.
Pedro não era um cara bom.
E por todos esses motivos - e alguns outros mais -, Pedro acreditava não ser bem quisto pela família dela. Talvez uma mentirinha, um “teatrinho”, uma falsidade, tivessem lhe caído bem e amenizado as dores, mas não era do seu feitio. A sua recusa pela religião da família dela transformara todo o embate em uma guerra santa, que, assim como todas as outras, de santa só levam o nome.
Mas Pedro sempre foi teimoso. Um amante teimoso. Sobre sua amada descansava seus olhos, e sobre sua cabeça todos os planos de um futuro feliz. E foi assim que durante muitos anos Pedro encarou a vida. Vestia sua armadura e colocava seu elmo, preparando-se para mais um dia em que teria de lutar em nome do amor.
Lutou.
Hoje, aos 86 anos, com a armadura quebrada, o elmo rachado, e as duas alianças que usa na mão esquerda, Seu Pedro descansa no banco de uma praça.
Ele sabe que não é um cara ruim, apenas lamenta o fato de não ter sido um cara bom.
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Crédito da foto: http://www.luizberto.com/wp-content/velho_em_banco.jpg